Leonardo Martins - Mentalista

domingo, 6 de outubro de 2013

Como vive quem não consegue memorizar nenhum rosto

Imagine do dia para a noite não conseguir mais reconhecer seus pais, filhos ou parentes mais próximos.

Você pode vê-los, mas não sabe quem são, nem se estão rindo ou franzindo a testa.

Foi o que aconteceu com o britânico David Bromley. Após sofrer uma lesão no cérebro, ele passou a apresentar um transtorno pouco conhecido, a 'cegueira de feições'.


Bromley, de 67 anos, convive com a desordem, cujo nome verdadeiro é prosopagnosia, desde os 11 anos. As pessoas com esse problema enxergam, mas são incapazes de identificar rostos. Ou seja, veem olhos, nariz e boca, mas não reconhecem nem a si mesmos nem a seus interlocutores, bem como gestos ou emoções.

"Eu posso reconhecer minha esposa se eu for para casa, pois parto do pressuposto de que será ela quem estará lá. Mas se a encontrar na rua por acaso, não vou reconhecê-la", disse ele à BBC.

Segundo médicos, a cegueira de feições afeta milhares de pessoas no mundo que, no entanto, não sabem que são portadoras do transtorno.

"Descobri que tinha esse problema quando fui a um encontro de amigos que não via há 30 anos. Dois deles tinham sido meus melhores amigos, fomos juntos a todos os festivais de música, viajamos juntos para a Espanha para trabalhar no verão. Éramos muito próximos, mas acabamos nos afastando pelos rumos diferentes que cada um tomou", conta Bromley.

Naquela ocasião, o britânico já estava se recuperando da lesão que havia sofrido no cérebro e pensava que a única sequela do acidente era a perda parcial de sua visão, que o impossibilitava de dirigir. Por essa razão, Bromley foi acompanhado do irmão ao encontro. A surpresa veio durante a conversa dentro do carro de volta para casa.

"Quando estávamos retornando, lembro que disse a meu irmão: 'Frank e Miky não mudaram nada, continuam exatamente os mesmos’, para logo em seguida, lhe perguntar: ‘Os dois estavam vestidos com teentops, não?' (espécie de suéter que esteve na moda nos anos 70)"

O que Bromley estava vendo, na verdade, era a memória que tinha de seus amigos daquela época. "Meu cérebro estava me dizendo que Frank e Miky estavam ali, mas a imagem que eu tinha deles não correspondia à realidade". "Foi então que descobri que tinha cegueira para feições".


Congênita e adquirida


Segundo a literatura médica, existem dois tipos de prosopagnosia: uma congênita, na qual a pessoa já nasce com o transtorno e outra adquirida, que ocorre normalmente após algum tipo de dano cerebral.

Estima-se que 2% da população mundial apresentam o primeiro tipo do transtorno. No Brasil, estudos mostram que pelo menos 5 milhões de pessoas sofrem da desordem.

Mas Bromley faz parte do segundo grupo, que é raro.

Esse tipo de constrangimento social também afeta a britânica Sandra, que não quis ser identificada na reportagem. Há 14 anos, ela teve uma encefalite (infecção no cérebro) que evoluiu para uma cegueira de feições.

Embora ela tenha desenvolvido uma versão mais branda da prosopagnosia, uma vez que pode reconhecer pessoas que conhecia antes de ter a desordem, prefere evitar o contato com elas.

"A vida com prosopagnosia é muito constrangedora, porque as pessoas me cumprimentam e eu não sei quem elas são. Caso seja alguém que esteja em seu local de trabalho (como o açougueiro ou o padeiro), posso adivinhar quem são. Mas se estão fora de contexto, não consigo reconhecê-las", conta ela à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

Sandra dá aulas em uma escola, mas seus alunos não sabem de sua doença. "Se eu vir alguém todos os dias, posso reconhecê-lo. Mas se eu encontrar um dos alunos na rua e ele me cumprimentar, posso inferir que se trata de uma criança da escola, mas não necessariamente sei quem é."


Cinco coisas que você precisa saber sobre a prosopagnosia 


  1. "Prosopagnosia " vem das palavras gregas "prospon" (cara) e "agnosia" (inabilidade de reconhecer).
  2. A prosopagnosia congênita ou verificada na primeira infância é chamada de "prosopagnosia desenvolvimental". Nesses casos, normalmente, não há uma causa médica conhecida.
  3. O transtorno também pode ocorrer como resultado de uma lesão cerebral. Nesse caso, é chamada de "prosopagnosia adquirida".
  4. Os pesquisadores sugerem que a prosopagnosia desenvolvimental pode ter herança genética.
  5.  Especialistas acreditam que uma parte específica do cérebro está envolvida no processamento e reconhecimento facial. Essa região é chamada "área fusiforme da face".

    Fonte: Universidade do Leste de Londres

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