O efeito poderoso das posturas observado na pesquisa de Amy Cuddy pode ser explicado pela neuroendocrinologia – ciência que estuda a relação entre os sistemas nervoso e endócrino.
Folhapress
“Essa conexão começa com a percepção física do corpo no espaço, que manda estímulos nervosos ao hipotálamo, região do cérebro que regula a hipófise, espécie de gerente-geral de todo o sistema hormonal”, explica Fabio dos Santos, cardiologista especializado em medicina integrativa em Harvard.
Isso, segundo o médico, referenda a influência da postura nos níveis hormonais que, por sua vez, estão ligados a emoções primárias, como medo, e a impulsos básicos, como lutar ou fugir.
“O que me surpreendeu no estudo foi a rapidez com que a postura produziu efeitos nesse sistema”, diz Santos.
Mesmo que o experimento tenha provado um efeito hormonal rápido, nada garante que ele perdure, segundo o psicólogo Fernando Elias José, mestre em cognição pela PUC do Rio Grande do Sul. “Pode funcionar momentaneamente, mas usar só a postura é pouco para uma mudança comportamental.”
Para o psicólogo, as evidências da pesquisa são frágeis: “O número de participantes é pequeno e as reações a desafios, em um experimento, não são iguais às reações em uma situação real, como uma entrevista de emprego”.
Também faltou isolar variáveis que podem ter influenciado o resultado, como o fato de o participante praticar ou não atividades físicas, acrescenta Fabio dos Santos.
SUPER-HOMEM DEMAIS Para adeptos da ioga, a relação entre posturas e mudanças hormonais não é surpreendente.
“A ioga mexe com áreas do corpo ligadas a determinadas redes de nervos que, quando estimulados, mandam impulsos para as glândulas produzirem mais ou menos hormônios”, afirma o biólogo e professor de ioga Anderson Allegro, da Aruna Yoga.
A ioga usa tanto posturas de extroversão quanto de introversão. “Ficar super-homem demais também não é legal”, diz Allegro.
As diferenças não param por aí. Na pesquisa americana, a mudança interior ocorre após meros dois minutos na posição de poder, enquanto na ioga as transformações de comportamento são percebidas após um bom tempo de prática contínua.
A neurociência também tem estudado a relação entre corpo, emoções, cognição e comportamentos.
“O António Damásio [neurocientista português] tem essa descrição da postura do vencedor que foi usada na pesquisa: peito aberto, cabeça para cima”, conta a terapeuta corporal Lucia Merlino, que estuda os conceitos de consciência e imagem corporal de Damásio para o seu doutorado sobre comunicação e ensino do movimento.
Para ela, a mudança interior acontece quando a pessoa chega a uma organização melhor do corpo e consegue adaptar suas posturas às demandas da vida, na interação com as outras pessoas.
“Você pode até querer ficar na postura de vencedor, mas às vezes é impossível fazer isso por causa de limitações do próprio corpo. Nesse caso, é preciso antes aprender a se soltar, ganhar amplitude”, diz Merlino. (Iara Biderman)
Se você faz a pose, mesmo fingindo ganha poder
A psicóloga Amy Cuddy, 40, ensina liderança e negociação na Harvard Business School (EUA). E estuda o aspecto menos óbvio das relações profissionais: a comunicação não verbal. Cuddy pesquisa como a linguagem corporal afeta a carreira e investiga de que forma as posturas podem causar mudanças comportamentais e fisiológicas profundas. A psicóloga, que atualmente estuda a relação entre liderança e níveis de cortisol, fala sobre seu trabalho nesta entrevista à Folha.Por que a sra. resolveu investigar posturas de poder?
Observando meus alunos percebi uma relação entre as posturas e sua participação nas aulas. Os que mostravam poses poderosas participavam mais e tinham melhores notas. Resolvi testar se o desempenho dos alunos mais retraídos poderia ser influenciado por meio das posturas corporais.
Qual é a relação entre posturas e hormônios?
Estudos mostram que quem assume a liderança de um grupo muda seu perfil hormonal: produz mais testosterona e menos cortisol. Sabemos que esses hormônios mudam conforme situações exteriores: se você fica parado no trânsito, o cortisol sobe; se você vai competir, a testosterona aumenta, mas, se perder, os níveis desse hormônio baixam. Nessas situações, as posturas corporais também são afetadas. Resolvemos pesquisar se o caminho inverso era possível: usar a organização do corpo para mudar as reações fisiológicas e comportamentais às situações estressantes.
Há diferenças para homens e mulheres ou para pessoas de diferentes meios sociais?
Na pesquisa, o efeito hormonal foi o mesmo para ambos os sexos e pessoas de diferentes etnias, mas os participantes ficavam sozinhos em uma sala enquanto faziam as poses. É possível que ocorram diferenças quando há interação com outras pessoas, porque temos normas sociais sobre as posturas apropriadas para homens, mulheres, jovens, subalternos.
Por que o efeito permanece depois que a pessoa deixou de fazer a postura de poder?
Se a pessoa enfrenta um desafio se sentindo confiante e relaxada, passa a mensagem de que tem poder. Os outros percebem a força e reforçam a sensação de confiança, o que sustenta o nível hormonal.
Em quais situações as mudanças posturais podem ser úteis?
Em entrevistas de trabalho, quando é preciso falar em público ou confrontar um superior ou tomar decisões que envolvem riscos. Tenho recebido mensagens de pessoas que mostram como as aplicações são amplas: desde professores que precisam enfrentar uma classe de alunos muito agressivos até uma idosa que vai a uma consulta e tem medo de fazer perguntas ao médico.
A sra. se considera uma pessoa poderosa?
Tenho autoconfiança, mas nem sempre foi assim. No começo da carreira, fingia estar confiante. Se você faz pose de poderosa, mesmo fingindo, ganha esse poder de verdade.
Fonte: Regional.net
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