Se o sujeito que observamos faz uma afirmação com base em uma falsa memória, seria possível perceber sinais indicativos da mentira?
Por Edinaldo Oliveira e Sergio Senna
Para IBRALC (parcial)
Primeiramente, o que é memória? Segundo Myers (1999, p. 210), a memória humana é uma incessante tentativa de reconstrução e reprodução de fatos já vivenciados. Ela envolve, portanto, um complexo mecanismo de arquivo e recuperação de informações. O termo memória tem sua origem etimológica no latim e significa a faculdade de reter e/ou adquirir ideias, imagens, expressões e conhecimentos, reportando-se às lembranças. A princípio, pode parecer fixa e inamovível, mas é maleável podendo ser criada, modificada e até mesmo perdida ao longo da vida.
Wilbert e Menezes, em seu artigo “Falsas memórias: o pecado da atribuição errada”, argumentam que “apesar de armazenadas, nem todas as recordações de uma experiência são lembradas com a mesma facilidade, isso ocorre em decorrência da forte vinculação entre a memória e outros fatores, como o nível de excitação emocional. Esses fatores influenciam o processo de recuperação da memória, não raras vezes, originando falsas memórias.”
Memorização dos meses do ano que contém 31 dias pelos punhos - Uma mnemônica é um auxiliar de memória. São, tipicamente, verbais, e utilizados para memorizar listas ou fórmulas, e baseiam-se em formas simples de memorizar maiores construções, baseados no princípio de que a mente humana tem mais facilidade de memorizar dados quando estes são associados a informação pessoal, espacial ou de carácter relativamente importante, do que dados organizados de forma não sugestiva (para o indivíduo) ou sem significado aparente. Porém, estas sequências têm que fazer algum sentido, ou serão igualmente difíceis de memorizar.
O processo de falsificação da memória ocorre justamente no momento de falha dos mecanismos de armazenamento ou recuperação dos fatos, levando as pessoas ao erro, seja por indução de terceiros, seja por recriação fantasiosa da própria pessoa.
Algumas falsas memórias são geradas espontaneamente, como resultado do processo normal de compreensão, ou seja, fruto de processos de distorções mnemônicas endógenas (de forma extremamente simplista, seriam os artifícios utilizados pela memória, afim de reter as informações) . Estas são as chamadas falsas memórias espontâneas ou autosugeridas (Brainerd & Reyna, 1995).
Um exemplo bastante comum de falsa memória espontânea seria quando presenciamos um evento e temos que retratá-lo posteriormente, como testemunha de um assalto por exemplo, ao relatarmos as características do assaltante, quantos eram, arma utilizada, etc. tendemos a passar alguma informação errada, que não condiz com os fatos. Por esta razão, quanto antes tomarmos os relatos, mais fieis aos fatos serão nossas lembranças.
Caso deseje entender um pouco mais sobre este problema, recomendo a leitura do artigo “(Des)Construindo o Testemunho no Processo Penal: o Problema das “Falsas” Memórias”.
Outro tipo de falsa memória pode resultar de sugestão externa, acidental ou deliberada, de uma informação falsa (Reyna, 1995), a qual não fez parte da experiência vivida pela pessoa, mas que de alguma forma é compatível com a mesma como no procedimento de sugestão de falsa informação.
Falsas memórias geradas por sugestão externa, acidental ou deliberada pode ser exemplificada da seguinte forma: tome um fato que ocorreu, como por exemplo, ver algo ao passarmos em determinada rua, como alguém passando na frente de uma loja de nome “y”. Posteriormente ao evento, sugerimos que na verdade, a pessoa viu alguém passando na frente da loja “x”, e será bem possível que ela assimile nossa “alteração”, passando a acreditar na segunda versão da história.
Não podemos esquecer também da reorganização de nossas memórias fruto de uma adaptação de nosso psiquismo em função do sofrimento. Diversas teorias psicológicas tratam disso, como por exemplo a psicanálise com certos mecanismos de defesa do ego que suprimem ou alteram nossas lembranças.
Qual a relação da falsa memória com a análise facial?
Então, se o sujeito que observamos faz uma afirmação com base em uma falsa memória, seria possível perceber sinais indicativos da mentira? Muito provavelmente não! Uma vez que os fatos narrados são, para o psiquismo do sujeito, a mais translúcida verdade.
Devemos lembrar que os três elementos teóricos para caracterizarmos uma mentira são:
- o mentiroso sabe a verdade;
- o mentiroso introduz alterações deliberadas na versão com a finalidade de criar uma falsa mensagem;
- o mentiroso aufere ganho de sua mentira.
No caso em questão, nenhum desses elementos está presente. Pois diante de uma falsa memória não há que falar em manipulação ou alteração consciente da informação e nem que isso tenha ocorrido para que alguém auferisse ganho. O que observamos é a tranquilidade da versão verdadeira, já que as informações estão “plantadas” na memória (espontaneamente ou por sugestão), não existindo motivo para que o sujeito fique nervoso, afinal, ele está descrevendo algo “verdadeiro”.
Fonte: IBRALC
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